Há tempos chegou o meu dia da recruta moderna, eu digo isto para parecer uma coisa imponente. Dia da Defesa Nacional, para ser sincero até gostei, até do almoço eu gostei! Estou a reinar, o almoço estava frio e as cadelinhas ainda respiravam.
A data começou bem com o motorista a pôr os meninos na linha, “TUDO A SENTAR DE FRENTE PARA TRÁS, NÃO QUERO BANCOS VAZIOS!”. Fora disso tudo bem, até levou a conhecer as capelinhas todas à volta do quartel para fazer tempo. Entramos pelas portas das traseiras na guerra, para ninguém nos ver, só faltou vestir o camuflado. Aquilo é uma avenida e tem mini aldeiazinhas de um lado e do outro, com fronteira e tudo, faz lembrar as aldeias gaulesas do Astérix ou aquelas repúblicas académicas que se vem nos filmes como
american pie (por falar nisso).“Não é que eles não façam o mesmo ou pior” avisou o motorista quando disse para não termos “relações amorosas” dentro do campo, “Amor, entramos na guerra, vamos dar um tempo ok? São ordens”.
1ª Actividade do dia foi ouvir o hino nacional, foi giro ver os soldados apresentar armas e estar em sentido e tal. Armas que eram espadas de capar grilos, como se na guerra usassem espadas para combater o inimigo. Soou a trompete e lá ficamos em silêncio a ouvir metade do hino nacional, a outra metade a radiofonia (que já deve ser do tempo da guerra (bom trocadilho)) não quis tocar, aquilo até podia correr bem se fosse como nos concertos onde o artista diz a primeira frase e o público canta o resto, mas ali acho que não fazia sentido.
Era um dia especial na unidade, o quartel fazia anos e contávamos com a presença do ministro da defesa. Íamos assistir a cenário de guerra com tiro real. Wow. Tomamos o pãozinho e o leitinho do pequeno-almoço da guerra e fomos assistir a uma cerimónia com discursos e condecorações. Luz do meio-dia, os convidados, chefes e ministro à sombra e os militares todos direitinhos ao sol. Digamos que não foi um momento agradável assistir aquilo. Só que de repente dá início o “show” propriamente dito. Lá começa um de vez enquanto a ir com a cara direitinho ao chão, caiem que nem tordos! Entendi nessa altura o porquê das armas deles não estarem carregadas. Meteu espécie, vem um sujeito aqui e para o convencer a ir para a tropa põem a ver militares a desmaiar logo ali afrente. Bom. As condecorações aos chefes, foi do género “4ª classe de artilharia”, penso que era pelas novas oportunidades, só pode.
A melhor parte. Tiros e carros a queimar gasolina, ou dinheiro a ser mal gasto como queiram. Iniciou logo bem com os convidados e a socialite a receber tampões para os ouvidos e o povo (nós) a ter de tapar os ouvidos com as mãos, na boa. O espectáculo ia começar. Primeiros 5 minutos e eu maravilhado com os carros andar e a maquilhagem que eles traziam. Pergunto a um tenente se podíamos ir ver os tanques quando terminasse a simulação, ao que recebo como resposta algo como “O Jovem está desde manhã a ouvir a falar de carros de combate e agora vem me falar de tanques de lavar a roupa?”, lá se foi a minha cunha para o exército, pensei eu. Vimos os militares a falarem uns com os outros por código em que metia Charlie Bravo Veado (no Brasil estavam tramados). Pode-se dizer que a carta final foi os disparos do F-16, temos 20 no país, visto que o Papá vem cá só de vez enquanto não sei o porquê de tantos.
É incrível a quantidade de dinheiro que se estoirou em meia hora, sem dúvida que o espectáculo foi bom, nem Filipe La Féria fazia melhor, mas foram uns trocos tão mal gastos. Se disser que em três soldados existe um carro de combate parado no parque de estacionamento deles não é mentira nenhuma. Para que tanto carro? Para fazer street racing na avenida? Fazem mesmo lembrar carrinhos de choque com aquelas antenas, se juntar os morteiros temos a festa de Agosto quase feita.
A minha ideia era dar uma espingarda uma bala e uma guita a cada um, assim quando disparassem bastava puxar a guita e reutilizavam a bala. Ou então como Raul Solnado dizia, era pôr a disparar supositórios, além de não matar ainda curavam alguns.
Podiam poupar noutras coisas como no arame farpado. Eles nem devem ganhar para as calças.
O resto do dia foi normal, com café oferecido pelo ministro. Juro que pensamos em levar o estado à falência e beber cafés até não nos conhecermos uns aos outros, mas depois ainda ouvia da minha mãe e era chato.
Em suma, recebi uma célula nova, para guardar num lugar Bimbo, "fresco e fofo". Piada de Alferes é o que dá.
Bem, vou aviar uma vida.
Rui Freire